“Eu comecei a escrever em 2006 com os Young Thugz aqui da minha zona.” É assim que Fumaxa começa por nos contar a sua história no hip hop. Fast–forward até aos dias de hoje, quis o destino que o seu foco transitasse das rimas para as batidas, levando-o ao encontro de um currículo que hoje já é um dos mais respeitados em Portugal. Dos trabalhos ao lado de Bispo, Chyna ou No1 às produções cedidas a gente como Landim, Blasph, Sanryse, Valas ou, mais recentemente, Julinho KSD — e não esquecendo o contributo que deixou em três dos discos mais aclamados dos últimos anos, You Are Forgiven, Deepak Looper e The Art Of Slowing Down —, parece que só lhe faltava mesmo tem um hit em nome próprio.
O trajecto foi longo e meteu pelo meio uma estadia em Londres antes do regresso em definitivo ao nosso país para vingar na emblemática dupla que formou com Bispo, tanto em disco como nos palcos. Longe de casa mas no conforto de uma comunidade lusa que o acolheu e o motivou na caminhada, Fumaxa aponta Fizz como “uma pessoa que foi muito importante” no processo de aprendizagem e relembrou como Marrokan lhe introduziu ao sampling na MPC durante uma conversa com o ReB.
Apesar do ar calmo e tranquilo que aparenta, Fumaxa é um verdadeiro turbilhão criativo e um dinamizador nato, cuja força motriz e motivação facilmente contagiam e fazem girar à sua volta os criativos que lhe estão próximos. No regresso a Mem Martins, já com uma dose de knowledge e algum capital para investir, uniu o bairro onde mora e juntou-se à Fitcha Broca Recordz, com alguns talentos locais, como Landim, Singa, BTG ou Thug PKP, uma editora independente especializada em rap de rua. Esta capacidade de pensar além da música e de criar e solidificar estruturas mantém-se e já fez nascer outros dois projectos, a HeadBangerz e a Dirty Doc, esta última uma ambiciosa equipa de produção liderada por si, que deixa a porta aberta à colaboração com outros músicos e que o ajuda nesta nova caminhada.
“O facto de estar com outros músicos em estúdio trouxe mais coesão à minha música”, começa por explicar. “Abriu-me portas para experimentar várias cenas e nunca ficar limitado à cena do sampling. O sampling é uma grande cena, é uma arte muito fodida e há poucas pessoas que sabem samplar como deve de ser. Mas acho que os instrumentos tocados vieram enriquecer a minha cena. Desde essa altura que passou a ser um must, uma obrigação, passar a minha cena a um músico e perguntar-lhe ‘o que é que achas?’ A coisa até pode ficar assim ou não, mas, regra geral, hoje tenho sempre alguém a tocar alguma coisa nos meus instrumentais.”
O colectivo surge como consequência natural do trabalho que tem vindo a desenvolver com outros colegas. “Eu e o Rubik terminámos de trabalhar no álbum do Slow J e ficámos ‘o que é que vamos fazer agora?’ Decidimos alugar um estúdio com o Migz, nós os três. Começámos a bulir lá com o Julinho, os Instinto 26… Na altura decidimos criar um nome e surgiu Dirty Doc. O Migz eu já o conheço desde 2012/2013 mas começámos a estar mais vezes juntos, em estúdio, para aí em 2016. O Rubik foi nosso aluno na ETIC e desde que lhe dei aulas que senti que o gajo tinha bué talento. Curti a vibe e a postura dele. É um puto bué humilde e respeitador. São cenas que um gajo preza. A partir daí fui-lhe dando o toque para ele ir lá ter connosco e as cenas foram fluindo. Alugámos estúdio os três e surgiu a Dirty Doc. Agora tudo o que fazemos é para Dirty Doc. Passamos beats uns aos outros, samples, drums… Tocamos em cima de cenas uns dos outros. Achamos que faz mais sentido e que dá mais coesão à nossa música.”
Sobre envergar num trilho a solo, o produtor confessa que esta é uma ideia que já vem de há algum tempo para cá, tendo apontado algumas das suas influências como exemplos, desde Alchemist a Dr. Dre — “Os meus produtores favoritos não são só produtores, também são vistos como artistas”. Mas a materialização deste sonho (com “The City is a Jungle”) não envolveu pressa e acabou por surgir naturalmente durante uma sessão de estúdio: “Nós temos estado a trabalhar com o Júlio desde o ano passado. Surgiu a oportunidade de estar com ele e com o Richie [Campbell] e boom.”
“A ideia para o single surgiu de forma bué natural. Nós já estávamos a passar muito tempo no estúdio a criar, fazer cenas, brincar e fazer dicas. Um dia decidimos dar o toque ao Richie para vir chillar connosco. Ele foi bué tranquilo e disse ‘ya, bora ouvir e fazer cenas’. Ele veio ter connosco, sentámo-nos a ouvir dicas, ele começou a curtir… Ele ouviu o beat e disse ‘é este aqui!’ Ele começa a escrever e entretanto o Júlio chegou. O Richie droppou o refrão, o Julinho sentiu a vibe e disse ‘Richie, então? Baza lançar esse mambo?’ Boom. A coisa ficou assim. Uma cena do caralho.”
E quais serão os próximos passos de Fumaxa em relação a uma carreira a título individual? “Eu não tenho planos por causa desta merda do corona… É fodido um gajo dizer o que é que vai ou não vai fazer. Eu só vou deixar o tempo passar e ver se faz sentido apostar num projecto. Claro que eu curtia de fazer mais cenas com artistas portugueses, mas temos de ver. Até porque um gajo está com mais cenas em cima da mesa, estou a bulir em projectos de outros artistas… É uma questão de ver.”
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