Antes de Algueirão Mem Martins se transformar num dos principais centros urbanos dos subúrbios de Lisboa, e a freguesia com mais habitantes de Portugal, era apenas uma aldeia discreta, rodeada de quintas e pinhais, onde o ar fresco natural da Serra de Sintra atraía famílias da capital em busca de descanso.
No início do século XX, quando a ligação ferroviária entre Lisboa e Sintra se consolidou, Algueirão Mem Martins tornou-se um ponto de paragem para quem desejava ficar "perto da serra”.
O comboio - símbolo de progresso e elegância - permitia que famílias abastadas de Lisboa viajassem facilmente até à vila de Sintra. Chegavam com bagagens, criadas e crianças, para passar semanas ou meses em casas alugadas ou propriedades próprias.
Entre os veraneantes, várias famílias conhecidas deslocavam-se até cá. Eram casas de linhas românticas, com azulejos e alpendres onde se tomava o chá com vista para a serra.
As manhãs começavam cedo, com o som distante do comboio e o cheiro do pão. Os veraneantes passeavam pela estrada de terra que ligava Algueirão, Tapada das Mercês e a Quinta da Fanares, e de costume cumprimentavam os lavradores locais com um aceno educado.
As senhoras visitavam as pequenas mercearias para comprar fruta fresca, leite e flores - produtos simples, mas “de uma pureza que em Lisboa já não se encontrava”, como escreveu um jornalista de 1932 no Diário de Notícias, referindo-se à calma bucólica de Algueirão Mem Martins.
Para os habitantes locais, a chegada das famílias de Lisboa era um acontecimento. Os meninos de cá corriam até à estação para ver “os senhores da cidade” e os seus modos refinados.
Os veraneantes que passavam a temporada cá tinham pequenos rituais que se repetiam ano após ano. Um deles era a paragem obrigatória no Casal da Cavaleira e no Casal de São José, onde compravam ovos frescos, colhidos há poucas horas, vindos das galinhas que ali se criavam ao ar livre. Esses produtos, simples e genuínos, tornavam as refeições ainda mais saborosas.
Outro destino certo era o Moinho de Sacotes e do Algueirão, onde muitos iam levar o cereal para moer ou apenas buscar farinha acabada de fazer. O cheiro a grão moído e o som das mós a girar eram parte da paisagem sonora das férias na terra - um símbolo da vida calma e autêntica que os veraneantes tanto prezavam.
O Progresso Clube de Algueirão-Mem Martins, foi uma coletividade que surgiu nos anos 40, do século XX, fundada sobretudo por famílias vindas de Lisboa que tinham casas de veraneio na zona - uma época em que a vila ainda era fortemente rural e marcada pela cultura saloia. Esses lisboetas procuraram criar um espaço de convívio “à sua maneira”, com bailes, jogos e eventos sociais, distanciando-se da população mais rural, tanto em hábitos como em estatuto social.
O nome “Progresso” reflectia essa ideia de modernidade e distinção urbana, em contraste com a vida mais campestre da população nativa.
Enquanto outras coletividades de cá (Mem Martins Sport Clube e Recreios Desportivos do Algueirão) tinham uma base mais comunitária e local, com espírito mais rural, com gente de trabalho mas mais humilde.
O Progresso Clube manteve durante bastante tempo uma certa aura de exclusividade social e cultural.

Nos dias quentes de verão, os veraneantes divertiam-se ao passear pelas nossas ruas soalheiras, sempre com a humidade oriunda da Serra.
Achavam curioso - e até encantador - ver, em certos quintais, grandes tabuleiros expostos ao sol, cobertos de pequenas rodelas de massa dourada.
Eram as cascas das queijadas de Sintra, deixadas a secar pacientemente antes de receberem o recheio doce e perfumado que lhes daria fama. O ar cheirava a farinha e a leite, e o quotidiano simples das gentes locais transformava-se, aos olhos dos visitantes, numa cena de autêntico encanto saloio.
Muitos nomes famosos tinha especial gosto por este local, como as pessoas do Grupo Onomástico "Os Carlos", que escolheu uma zona da freguesia, adquirindo 14mil m2 para implementar "Casa de Repouso de Carlos doentes", "Casa de agasalho para Carlos Inválidos" e "Colónia de Verão para Carlos Miúdos".
Este projecto acabou por nunca ser implementado, ficando apenas a memória na zona, e muitos Homens da freguesia nascido nesta altura também terem ficado com o nome de Carlos.
Muitos nomes deixaram fortes memórias, como foi o caso do Professor Dr. Joaquim Fontes, que era um médico Obstetra que residia em Lisboa, e tinha a sua Quinta em Mem Martins, o "Casal dos Choupos" e foi um dos grandes incentivadores da criação das Festas de Nossa Sra da Natividade.
Fala-se que a Sta padroeira de Mem Martins é a Sra Natividade pelo motivo do dr. Joaquim Fontes ser obstetra.
Com o crescimento urbano e o aparecimento das primeiras fábricas e conjuntos habitacionais nas décadas de 1950 e 1960, Algueirão-Mem Martins começou a mudar. As casas senhoriais foram sendo vendidas ou demolidas, as grandes quintas divididos em lotes, e o comboio passou a trazer sobretudo trabalhadores pendulares, e não veraneantes.
Mas, entre as ruas sub-urbanas e os prédios ao estilo "Pato Bravo" ainda se encontram vestígios desse passado: um portão de ferro enferrujado com as iniciais de uma antiga família, um tanque de pedra esquecido num quintal, ou o nome de uma rua que recorda a uma antiga quinta.
O tempo apagou muito, mas não tudo.
Nas memórias de quem ainda recorda, Algueirão-Mem Martins que foi, durante meio século, um refúgio de veraneio - um lugar onde o campo e a cidade se encontravam, e onde a Serra de Sintra era, mais do que cenário, um remédio para o corpo e para a alma.