Tempo em Algueirão Mem Martins

quarta-feira, 5 de novembro de 2025

SAUDADE do que era...

Houve um tempo em que andar pelo centro de Mem Martins era mais do que fazer compras — era fazer parte de uma família alargada. As ruas cheiravam a pão quente, a café moído e a perfume de domingo. Cada porta aberta tinha uma história, cada comerciante um sorriso, e todos sabiam o nome de quem entrava.

Logo pela manhã, o aroma irresistível da Padaria Primavera espalhava-se pela rua. O pão saía do forno ainda fumegante, e formava-se uma pequena fila de vizinhos que trocavam risos e notícias enquanto esperavam a sua vez. O padeiro, de avental branco, conhecia os gostos de cada freguês: “Um pão de Mafra para o Sr. António, duas carcaças para a D. Rosa, e um bolo para a menina que fez anos ontem.”

Mais acima, a Pastelaria Granada era um verdadeiro ponto de encontro. As vitrines brilhavam com pastéis de nata e duchesses, e o som das chávenas misturava-se com o burburinho das conversas. Era lá que muitos marcavam encontro antes de apanharem o comboio, e onde se discutia o futebol e a vida — sempre com o sabor doce de um bolo acabado de sair do forno.

A poucos passos, a Pastelaria Fino Gosto tinha o nome certo: elegante, acolhedora, e com um toque especial nas receitas. O cheiro a açúcar e baunilha convidava a entrar, e os clientes sentavam-se junto às janelas para ver o movimento da rua. Era comum ver estudantes, casais e famílias inteiras ali reunidas, entre fatias douradas e risadas leves.

Mais ao fundo, o Restaurante Chaby era o orgulho da vila. As suas toalhas brancas e a comida caseira traziam gente de longe. Ali celebravam-se aniversários, almoços de domingo e reencontros de amigos. A cada prato servido, havia uma história contada, um brinde feito — e uma memória criada.

E mesmo ao virar da esquina, as montras do Pronto-a-Vestir Lucanda exibiam novidades que faziam sonhar. Entre vestidos coloridos e camisas engomadas, as senhoras escolhiam com cuidado o traje para uma festa ou o casaco novo para o inverno. A dona da loja, sempre atenta, sabia o gosto de cada cliente: “Este fica-lhe bem, D. Maria, é a sua cor.”

Ao cair da tarde, quando as portas começavam a fechar e o último comboio passava ao longe, ficava no ar um sentimento de pertença. Cada loja, cada balcão, cada rosto conhecido fazia parte de um tempo em que o comércio local era o coração vivo de Mem Martins — e onde o valor maior não era o troco, mas a confiança.

Hoje, quem passa por essas ruas talvez já não veja os mesmos letreiros. Mas quem as viveu, ainda as sente. Porque o verdadeiro centro de Mem Martins não era de pedra nem de asfalto — era feito de pessoas, aromas e memórias que continuam a morar no coração de quem lá cresceu.

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