Noticia do Jornal Publico de 12 de Junho de 2015http://www.publico.pt/culturaipsilon/noticia/grognation-mem-martins-e-mesmo-bom-1698455
Como é tradição nos colectivos de hip-hop – dos
Wu Tang-Clan aos Odd Future –, os Grognation projectam efectuar lançamentos em
nome do colectivo e outros assinados individualmente. É assim que António Silva
(Factor ou Nasty Factor), Rui Pereira (Papillon), Tiago Gomes (Prizko), Harold
Tembe (Tem-P) e André Gomes (Neck) vislumbram o que fazem, atropelando-se a
falar de Mem Martins, que também costuma estar presente nas deambulações
líricas do grupo.
Como outros projectos semelhantes, os cinco
conheceram-se na escola e, motivados por alguns gostos comuns, começaram a
criar música no quarto de Factor, tendo concebido temas e duas mixtapes para consumo digital. Mais do que uma afinidade quase familiar, o que os uniu foi o
pragmatismo, essa ideia de que seria mais fácil chegar a algum lado em grupo.
“Cinco cabeças funcionam melhor do que apenas uma em termos de comunicação”,
resume Factor, “por isso resolvemos aliar-nos. Por isso e porque temos os
mesmos ideais e gostos comuns dentro do rap”.
Mais do que uma afinidade quase familiar, o que uniu os Grognation foi o pragmatismo, essa ideia de que seria mais fácil chegar a algum lado em grupo NUNO FERREIRA SANTOS |
Estão juntos há quatro anos, sentem que a
Internet foi essencial na sua difusão, e um dos aliados tem sido Sam The Kid,
que produziu o primeiro EP e também terá essa função no álbum que estão a
projectar. Conheceram-no depois de terem lançado a primeira mixtape e
de distribuírem flyers em
festas de hip-hop onde divulgavam a sua página de Facebook. Aliás, sentem que
se têm tido alguma projecção, em parte devem-na também ao facto de terem sido
acarinhados por figuras mais adultas do hip-hop como Bob da Rage Sense. “Ele
foi um dos primeiros a estar connosco e a dizer-nos para termos confiança no
que estávamos a fazer, o mesmo acontecendo com o Sam The Kid, o Valete ou o
D-Mars. Em grande medida foi a partir daí, com esse reconhecimento, que
começámos a ser seguidos.”
Na postura dos Grognation não se vislumbra um
cunho político, uma tentativa de afirmação identitária ou uma vertente mais
lúdica. Não são fáceis de enquadrar. Optam por dizer que são um pouco disso
tudo. “Temos algumas letras socialmente conscientes, um pouco de Valete e de
Sam, um pouco de rap americano, mas também qualquer coisa de angolano. Não
espelhamos um único tipo de influências, tentamos adoptar várias perspectivas”,
refere Pappilon, assumindo que o rap está hoje mais electrónico do que há uma
década, quando a utilização de samples dominava.
Recentemente estiveram presentes no festival O
Hip-Hop Sou Eu, no Coliseu dos Recreios em Lisboa, ao lado de Sam The Kid,
Mundo Segundo ou Jimmy P, mas também de representantes das gerações mais novas
como MGDRV, Plutónio ou Bispo, e acreditam que a cultura popular em Portugal se
orienta cada vez mais para o hip-hop. E não só. O facto de a kizomba e o kuduro
terem também grande protagonismo hoje em dia ajuda também, ainda que de forma
indirecta, ao crescente interesse à volta do hip-hop. “O hip-hop sempre
foi autónomo dessas movimentações e continuará a sê-lo”, reflecte Prizko, mas o
“facto de haver muita gente a ouvir kizomba com influências de R&B, por
exemplo, vai originar que algumas pessoas se interessem por outros géneros.
Existe uma grande fusão e isso é bom”.
Os Grognation agradecem o apoio de figuras mais adultas do hip-hop como Sam The Kid ou Bob da Rage Sense NUNO FERREIRA SANTOS |
Nesta fase, os Grognation ainda não conseguem
viver da música. Uns trabalham, outros estudam. Mas todos possuem o desejo de
profissionalizar a sua actividade. Os olhos brilham, entre a esperança e o
sentimento de dificuldade, quando falam disso, ao mesmo tempo que vão enunciando
os nomes daqueles que acham que já alcançaram esse patamar: “O NGA, o Sam, o
Valete, a Capicua, agora, talvez. Não é fácil.”
Quem tem estado de olhos neles é Fred Ferreira
(Orelha Negra, Banda do Mar), de quem os Grognation falam com entusiasmo e admiração,
e que pretende lançar uma plataforma editorial conectada com novos valores do
hip-hop e tudo à volta. Matéria prima parece não lhe faltar.