Por aqui teremos canções até esta sexta-feira. Não são playlists como
antigamente, gravadas em cassetes saudosas, mas vêm com o mesmo amor e devoção
dessas playlists de outrora
A música
pop nunca será efémera, ao contrário do que dizem por aí. Nem irá morrer, pelo
menos na memória de quem tinha o quarto forrado com posters, casacos de ganga
cravados de crachás ou uma coleção de singles (se a memória não me engana,
custavam 250 escudos, o que equivaleria hoje a 1,25 euros) comprados na Limite
ou no centro comercial Galáxia depois de espremidas as poupanças. A ideia era
ouvir o lado A até à exaustão. Quando isso acontecia virávamos para o lado B,
tentando gostar dele mesmo que fosse mais fraquinho. Era-o quase sempre, mas
nunca o admitíamos, nem a nós próprios.
A
descoberta da pop começou com a cena neorromântica. Bandas com penteados
coloridos e a desafiar a gravidade, roupas futuristas e refrãos orelhudos que
nos punham a dançar de olhos fechados e a desejar secretamente sermos o Simon
Le Bon ou o John Taylor da escola preparatória. Os telediscos (uma novidade na
altura) eram como fogo de artifício que não nos deixava tirar os olhos da
televisão.
A
febre seguinte já era mais séria. Ainda tinha a ver com estilo, pose, roupa,
penteados... Olhando para trás, se calhar tinha principalmente a ver com
estilo, pose, roupa, penteados... mas as letras levavam-nos até outras
dimensões. Eram escritas por uns tipos dez anos mais velhos do que nós que
também tinham crescido em subúrbios desinteressantes de cidades industriais
inglesas. Havia tristeza, melancolia na voz, mas também algum hedonismo saído
dos sintetizadores, sequenciadores e caixas de ritmos. Um cocktail de emoções
up, down and turn around que se tornou numa dependência saudável, injetada
diretamente nos ouvidos. E também um escape perfeito à paisagem que me
acompanhava no trajeto entre casa, secundária e mais tarde universidade. Sem a
pop, mais ou menos alternativa, dos Joy Division/New Order, The Cure, The
Smiths, Depeche Mode ou The Jesus and Mary Chain, o percurso percorrido até
aqui não teria tido metade da piada.
Também
seriam mais cinzentos os dias sem as noites na cabina de DJ do Kafka. Como é
que nunca ouviram falar no bar que embalava a nightlife em Mem-Martins?
Imperdoável. Adiante: a viagem musical levar-me-ia até às estações de
Madchester, à brit-pop londrina e ao trip-hop de Bristol (inexplicavelmente, ou
não, Seattle ficou fora de rota). Estas revelaram-se no entanto terapias
hormonais de substituição dos mestres Ian Curtis, Robert Smith, Morrissey, Ian
McCulloch e irmãos Reid.
As
pistas que estes senhores deixaram pelo caminho levaram-me até aos seus
herdeiros musicais: os M83, os Hot Chip, a La Roux, os The XX, ou os Cut Copy
serão uma espécie de netos, alguns mais afastados, daqueles avozinhos de gabardina.
Não vão ter a mesma longevidade (a indústria musical é ainda mais voraz do que
nos eighties) mas soam frescos como uma salada tutti frutti numa tarde de
verão.
Já
não os oiço nos singles e LP de vinil (guardados na estante à espera de um
gira-discos). Também não rabisco listas com o meu top20 em cadernos da escola.
Mas o gozo pela pop (não demasiado açucarada e com vontade em ser independente)
permanece imaculado. Fica aqui uma (condensada) playlist para ouvir sem guilty
pleasures.
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