Nasceu em Sintra há 36 anos, certo?
Sim, em Mem Martins.
Sim, em Mem Martins.
Como
foi a sua infância?
Foi numa zona a que devo a
maior parte das coisas que sou hoje porque foi lá que conheci a desigualdade de
que tanto falo, em que alguns têm tudo e outros não têm nada. Foi em Mem
Martins que comecei a sentir a questão das minorias e a questão do Estado que
esquece algumas zonas do país. Os subúrbios são muito esquecidos. Quando falo
destas situações, as pessoas sentem que estou a ser autêntico.
Como foi a sua infância? Brincava na rua?
Sim, andava de bicicleta, o
meu pai andava no negócio das bicicletas. Eu queria ser ciclista, era a minha
grande paixão.
O seu ídolo era Lance Armstrong?
Sim. O dia em que ele
reconheceu que se dopou foi uma das últimas situações em que chorei. Eu ia de
bicicleta para todo o lado. A bicicleta fazia-me sentir como se tivesse de
superar sempre mais obstáculos. Achava que tornar aquilo profissional era
conseguir ser alguém numa terra onde as pessoas sentiam que era difícil sair
dali, passar um certo escalão social. Eu queria muito.
Chegou mesmo a pensar ser profissional?
Sim.
Tinha aquela bicicletas de alumínio para fazer provas. Cheguei a participar em
provas locais.
E o talento, era algum?
E o talento, era algum?
Não,
não era, mas nós apercebemo-nos, por exemplo, que, ao contrário do futebol, de
que eu sempre gostei mas não fui convocado uma única vez... cheguei a it
treinar ao Sintrense e ao Arsenal 72, que é um clube pequenino ali em Mem
Martins, e nos treinos o treinador ia escolhendo os que queria que ficassem. Eu
ficava para o fim, uma coisa terrível. E mesmo quando depois fiquei, nunca fui
convocado. Não fiz um jogo.
Quis ser ciclista, mas também
quis ser padre. Como é que a fé aparece na sua vida?
Não
fui batizado em criança. Os meus pais acharam que eu devia ter liberdade de
escolha religiosa. Nunca fui religioso até aos 13,14 anos. Foi já quando estava
numa fase mais adiantada que me tornei religioso. Mas tornei-me muito
religioso.
Porquê?
Hoje
tento olhar para trás e também não consigo explicar muito bem. Mas isto é
autêntico: eu fui à igreja por minha iniciativa. Queria saber porque sentia
este apelo dentro de mim. Fui à Igreja do Algueirão, uma igreja com muita
gente, muito complicada nas dinâmicas internas pelo tipo de pessoas que a
frequenta. Depois baptizei-me, crismei-me e, como estava muito imbuído de fé,
fui para o seminário.
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