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sábado, 10 de abril de 2021

[Bombeiros.pt] Combate a fogos nas cidades é luta constante contra “armadilhas”

Ruas estreitas e casas construídas em banda, e com materiais inflamáveis, ou carros mal estacionados. A isto pode juntar-se ainda sinalização vertical recente em sítios que impedem a passagem de veículos de socorro. 

Os centros históricos dos núcleos urbanos são desafios à operacionalidade dos bombeiros



Pitorescos, aprazíveis para turistas e habitantes locais, os centros históricos das cidades recheiam-se de memórias e de histórias. Mas, quando diz respeito à operacionalidade de meios de socorro, os problemas são muitos e vêm à tona. Mesmo que, nos últimos anos, os municípios tenham investido na regeneração, as obras nem sempre se mostraram eficazes. Pelo contrário, em muitos casos, trouxeram problemas acrescidos. Há sinais de trânsito mal colocados, pilaretes em sítios indevidos e marcos de incêndio com acesso dificultado, que se juntam ao cenário, já de si difícil para os bombeiros, de ruas estreitas, muitas vezes sem saída ou íngremes. Tudo a dificultar um trabalho que se quer, essencialmente, rápido. E eficaz.

A acessibilidade aos locais é um dos maiores desafios dos bombeiros, quando são chamados a um centro urbano histórico, seja por uma situação de incêndio ou para transporte pré-hospitalar.

“As ruas estreitas e becos apertados dificultam e limitam a progressão dos veículos, aumentando o tempo despendido nas manobras. O que faz com que haja atraso na chegada ao local do sinistro e, consequentemente, atraso no socorro e no combate a incêndios”, deixa claro Pedro Barreirinha, comandante dos Bombeiros Voluntários de Ílhavo, na sua tese de mestrado em Planeamento Regional e Urbano, que apresentou na Universidade de Aveiro, intitulada “Os desafios da intervenção dos bombeiros nos centros urbanos antigos”.

Existem problemas acrescidos ao nível da própria distância de segurança, por se tratarem, essencialmente, de casas em banda

À acessibilidade junta-se outro problema: os materiais com que são construídas muitas das habitações. “O tipo de construção não tem segurança contra incêndio. E também existem problemas acrescidos ao nível da própria distância de segurança, por se tratarem, essencialmente, de casas em banda. Além da ausência de compartimentação e de deteção rápida de incêndios”, explica Joaquim Leonardo, comandante dos bombeiros de Algueirão – Mem Martins, a maior freguesia do país.

Num caso de fogo urbano, dada a complexidade da construção e a parca capacidade de água disponível nos locais, os bombeiros são obrigados a mobilizar para o teatro de operações um elevado número de meios, como veículos de combate a incêndios urbanos, tanques táticos, ambulâncias e veículos de comando. É que é necessário combater o incêndio e, ao mesmo tempo, proteger as habitações contíguas.

“Os arruamentos estreitos fazem com que haja a necessidade de parar os veículos na via de maior dimensão e efetuar o estabelecimento dos meios (esticar as mangueiras, por exemplo) dessa zona, até à zona afetada. O que, por vezes, pode ser algumas centenas de metros”, exemplifica o comandante de Ílhavo, no seu trabalho académico. E há corporações de bombeiros que tiveram que investir em veículos de menores dimensões. No caso de assistência pré-hospitalar, o cenário não é tão complicado, mas as ambulâncias têm que ficar na via principal e os doentes são transportados, em maca.

A regeneração urbana dos centros históricos é uma prática que tem vindo a crescer, quer em Portugal, quer na Europa, alavancada, em muito, pelo apoio de fundos comunitários. Mas, quando as obras de melhoria são feitas, aparentemente, as corporações de socorro não emitem qualquer parecer.

Há pracetas feitas, a cumprir a legislação, em que efetivamente conseguimos ter acesso, mas onde os nossos veículos não conseguem dar a volta

“Há essa falta de sensibilização, porque raramente se ouvem os bombeiros. Depois, há pracetas feitas, a cumprir a legislação, em que efetivamente conseguimos ter acesso, mas onde os nossos veículos não conseguem dar a volta, por exemplo”, lamenta Joaquim Leonardo, sublinhando, também, casos em que a sinalização vertical colocada dificulta a passagem.

Não sendo praticável a alteração da estrutura dos centros históricos, torna-se necessário encontrar alternativas que auxiliem o trabalho das equipas de socorro. Tornar as zonas estritamente pedonais, com “a colocação de equipamentos, como barreiras automáticas, para permitir apenas ao acesso a veículos autorizados”, é, para Pedro Barreirinha, uma das medidas a ter em conta. “Devolver as cidades mais à população e à mobilidade suave, no fundo”, aponta.

Organizar o tráfego, com a criação de baías de estacionamento, é outra das soluções, assim como levar a cabo ações de sensibilização e inspeções periódicas aos locais. Mas a mais inovadora que o especialista em planeamento regional e urbano indica é, mesmo, a instalação de “colunas secas”.

“Fazer, nos centros históricos, algo à semelhança do que existe nos edifícios de grande altura. Uma coluna seca é uma rede de incêndio toda estruturada, que não tem água. No momento do fogo, chega um veículo de combate a incêndios, liga uma mangueira de grande dimensão a essa coluna e abastece todo o prédio. Podia-se fazer o mesmo, nos centros históricos, aquando das regenerações, para a tubagem ficar enterrada”, conclui o autor da tese.

Fonte: Jornal de Noticias – Salomé Filipe

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