O Feijão Verde Natura Fun Park Sintra, situado na freguesia de
Algueirão-Mem Martins, está desde 2020 no centro de uma contenda entre
os moradores e a empresa que gere o espaço.
Filomena Morais mora há mais de 20 anos num bairro de moradias em
Algueirão-Mem Martins e há quase dois anos que questiona a Câmara
Municipal de Sintra sobre as obras que viu acontecer, em outubro de
2020, mesmo em frente à sua casa.
"Nessa altura
questionei a câmara para saber o que estava a ser feito por lá. Em
novembro desse ano conseguir consultar o pedido de licenciamento e nesse
pedido diziam que atividade a existir ali seria agrícola e de gestão
florestal. Ora, isso não tem nada a ver com o que está a ser feito",
relatou ao SAPO24.
As obras dariam
origem ao Feijão Verde Natura Fun Park, que é separado do bairro
residencial de 23 moradias por uma estrada de dois sentidos. Na
sequência das queixas apresentadas por moradores, dos quais Filomena
Martins tem sido porta-voz, o SAPO24 questionou a autarquia de Sintra
sobre as queixas relacionadas com ruído, falta de privacidade, problemas
no estacionamento e congestionamento das vias.
Ao longo dos últimos dois anos, o grupo de moradores tem
questionado a autarquia sobre as atividades do parque e as suas
licenças.
"Comecei a minha jornada em outubro de 2020 e
nunca acederam a receber-nos [na Câmara Municipal]. Responderam a dizer
quais os processos que existiam, eu insisti que queria falar com alguém
antes de isto começar a funcionar. Não cabe na cabeça de ninguém
instalar um parque junto a uma zona residencial, porque nós ao fim de
semana nunca temos descanso", reitera, acrescentando que a vizinhança
nunca foi consultada em todo o processo.
A resposta sobre as queixas dos moradores chegou à redação
do SAPO24 no dia 6 de agosto, alguns dias depois de ter sido questionada
a autarquia, e com a informação da decisão de encerramento das
instalações.
Confrontada pelo SAPO24 com as queixas de
moradores, "a fiscalização da Câmara Municipal de Sintra deslocou-se ao
local este sábado [6 de agosto] e assegurou a saída do público presente
em segurança, tendo notificado os proprietários e procedido ao
encerramento do Fun Park Sintra por falta de licenciamento".
Na
nota de resposta enviada ao SAPO24, a autarquia acrescenta que o Feijão
Verde Natura Fun Park Sintra "já tinha sido alvo de um embargo em 2020,
por parte da Câmara Municipal de Sintra, devido à construção de
estruturas sem licença".
"A entidade responsável pelo
equipamento apresentou, em fevereiro deste ano, um pedido de
licenciamento para construções no espaço e licenciamento que se encontra
em apreciação e aguardar pareceres de entidades externas", informa a
autarquia.
"O município levantou um auto de contra-ordenação,
tendo ainda o Presidente da Câmara Municipal de Sintra determinado o
acompanhamento da situação por parte do Gabinete Médico Veterinário do
município de Sintra”, conclui a nota.
Uma polémica com quase dois anos
O Feijão Verde
Natura Fun Park em Sintra é um parque que alia diversões, como
escorregas e outras estruturas para brincar, à presença de vários
animais, como cangurus ou um dromedário, à semelhança de uma quinta
pedagógica, e que prevê ainda a possibilidade de acampamento. Ou seja,
famílias podem alugar uma tenda no parque e ficar por uns dias a tirar
proveito do ambiente e das infraestruturas.Filomena Morais diz que numa fase inicial contestou o
barulho das obras, "porque as faziam também ao fim de semana", agora
queixa-se não apenas do ruído, mas dos problemas de estacionamento e
acessibilidades, do lixo e dos maus cheiros que emanam do parque.
No
último e-mail recebido por esta moradora, com data de 21 de julho de
2022 e a que o SAPO24 teve acesso, a Câmara Municipal informa o
seguinte:
"Encarrega-me a Exma. Sr.ª Coordenadora do GSMV
– Gabinete de Saúde Pública, Segurança Alimentar e Médico Veterinário,
de a informar em relação à sua exposição (Reg. SM 29770/2022), relativa à
existência de reclamações de ruído dos animais (falta de descanso,
bem-estar e saúde em geral) proveniente da atividade de um parque/quinta
pedagógica denominado 'Feijão Verde Natura', com sede na Rua da Cruz,
n.º 49 – Pexiligais, que foi solicitada informação à DGAV (Direção-Geral
de Alimentação e Veterinária) – O espaço possui o Título de Registo de
Exploração (classe 3) n.º 61-1/2021/LVT, emitido ao abrigo do REAP –
Regime de Exercício da Atividade Pecuária, detendo várias marcas de
exploração, existe também o parecer favorável do Ministério da Defesa
Nacional Força Aérea, por se tratar de área abrangida pela Base Aérea de
Sintra".
Acrescenta a nota que "foi igualmente solicitada
informação ao Departamento de Urbanismo desta Câmara quanto à licença de
construção do referido parque, tendo sido efetuado um pedido de
'Licenciamento de obras e outras operações urbanísticas com ou sem obras
de demolição' na Plataforma do Urbanismo Online, o qual se encontra em
apreciação. Acresce informar que já foi realizada uma vistoria ao local
entre o GSMV e o SEPNA (Serviço de Proteção da Natureza e Ambiente),
decorrente de denúncias no âmbito do bem-estar animal. Por último,
esclarecemos que a competência de fiscalização em termos de ruído é da
alçada da GNR ou PS."
"Faz 21 anos desde que moro aqui e neste momento a minha vontade é ir-me embora"
A resposta não tranquilizou os moradores.
"Ao
fim de semana isto é o caos total, pelo barulho, porque são imensas
crianças e adultos. Quando são dois ou três miúdos é muito giro, mas
quando são 20 ou 30... Os animais fazem barulho durante o dia e a noite.
A questão do ruído continua a ser a que mais me incomoda", confessa
Filomena Morais."Depois é o caos do estacionamento, porque o
estacionamento é numa ponta do parque a entrada noutra, então os carros
estão todos estacionados pela rua fora e por vezes só consegue passar um
carro [numa rua que é de dois sentidos]. A Câmara Municipal nunca
deveria ter permitido a abertura deste estabelecimento sem isso estar
acautelado", lamenta.
Fala ainda dos cheiros dos animais e do lixo: "eles agora
produzem imenso lixo e os nossos contentores estão sempre apinhados",
diz. "Eu deixei de ter privacidade e sossego. Para mim e para as outras
três vivendas que estão mais perto da entrada é caótico", diz.
Por
diversas vezes chamou a polícia, que entretanto, conta, deixou de se
deslocar ao local. "Deixaram de vir, eles acham que nós é que estamos
errados".
Apesar de todas as queixas, reconhece que "o
parque é fantástico, é um parque aonde eu gostaria de ir, os espaços
estão muito bem concebidos, só não está colocado no sítio certo".
"Faz 21 anos desde que moro aqui e neste momento a minha vontade é ir-me embora", conclui.
"É
de lamentar que um terreno que esteve abandonado durante 50 anos, onde
havia cobras e entulho, e que hoje está como está, seja mal visto aos
olhos de uma ou duas pessoas"
Questionado sobre as
queixas dos moradores, João Teixeira, porta-voz do Feijão Verde Natura
Fun Park, confirmou que a empresa está "a par, porque os moradores já
fizeram chegar ao município essas queixas e o município fê-las chegar a
nós".
Na conversa, tida poucos dias antes da nota da autarquia
enviada ao SAPO24, onde dava conta do encerramento do parque por falta
de licenciamento, João Teixeira deixava clara a posição da empresa sobre
esta matéria: "O Feijão Verde teve o cuidado de chamar as entidades
competentes para verificarem as condições sanitárias do parque e dos
animais, tivemos inclusivamente o cuidado de chamar a câmara, o canil
municipal, o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF)
e também a Direção Regional de Agricultura e Pecuária, que estiveram no
parque há cerca de um mês e meio. Desta visita conjunta resultou um
premiar da nossa atuação, deram-nos os parabéns pelo espaço, pelos
habitats conseguidos, pela forma como os animais estão livremente
instalados e como estão tratados".
Questionado sobre os
maus cheiros disse que é " um absurdo, um disparate total", deixando a
nota de que uma visita ao espaço chegaria para o comprovar. Sobre o
lixo, garantiu apenas que não fazem uso dos caixotes do bairro.
Já
o estacionamento "é efetivamente um problema" que, assegura, "está em
fase de resolução, com a construção de uma baía de estacionamento".
Mas
este "é um problema para mais uns dias, porque o parque no final do mês
[de agosto] encerra". O encerramento no inverno é comum a outros
parques com animais, mas neste caso "vamos alterar o modelo de
exploração e de gestão do parque", que está "em fase de transição de
proprietários". Questionado sobre o futuro da unidade, disse que o
processo está em curso e que, portanto, não podia revelar mais detalhes.
Face às queixas dos moradores, o porta-voz fez questão de
salientar as mais-valias do Feijão Verde Natura Fun Park Sintra: "no
sítio onde está o parque estavam projetados 80 blocos habitacionais que
teriam um impacto dez vezes superior àquele que o parque tem". Além
disso, diz, "o parque tem tido um papel importante na promoção da defesa
do meio ambiente e dos habitats de alguns animais", através de
iniciativas de sensibilização e promoção ambiental desenvolvidas junto
de escolas.
Depois, aponta o dedo aos moradores. Refere
que as queixas são essencialmente de dois moradores, ambos com interesse
no terreno, "porque há vizinhos que apreciam a nossa presença". "É de
lamentar que um terreno que esteve abandonado durante 50 anos, onde
havia cobras e entulho, e que hoje está como está, seja mal visto aos
olhos de uma ou duas pessoas. Não estamos a falar de uma comissão de
moradores", reitera. Ao que o SAPO24 apurou, há pelo menos sete
moradores que contestam a localização do parque.
O site o grupo
Feijão Verde dá agora nota, após o encerramento ao público no sábado
passado, que as visitas ao Feijão Verde Natura Fun Park Sintra apenas
podem ser realizadas "mediante marcação prévia".