Podem até estar a passar despercebidos nos principais orgãos de comunicação portugueses, mas o grande hit nacional deste Verão pertence-lhes. Falamos no cristalino “Sentimento Safari”, a canção que consagrou a voz de Julinho KSD, defensor das cores dos Instinto 26, enquanto uma das maiores certezas para o presente e futuro da nossa — cada vez mais plural — cena musical urbana.
E embora o foco recaia sobre o cantor do Casal de S. José, Mem Martins, o grupo torna-se ainda mais valioso como um todo, ele próprio uma projecção traçada a régua e esquadro das mais importantes ramificações às quais o hip hop se tem estendido nos últimos tempos. Se em “Sentimento Safari” está patente a veia afro que move Julinho — que já havia sido notada em “Hoji en sa tá vivi” e vincada mais recentemente em “Vivi Good”, este último já com dois dos seus colegas de estúdio à boleia da ginga — cabem também neste caldeirão os ritmos que fazem ruir qualquer alicerce dentro das grandes cidades e suas periferias como o trap e o drill norte-americanos que Londres tem ajudado a reformular: apesar de não representarem ainda parte significativa do sucesso comercial dos Instinto 26, as indicações dadas por Kibow e Trista — em “007” e “Concorrência”, respectivamente — permitem-nos olhar sorridentes para o futuro também nesse capítulo. E não esquecemos neste quadro Yuran, que ainda à falta de um tema a solo acompanha com destreza os seus pares quando chamado a prestar serviço, seja qual for terreno.
Por tudo isto, já se previa que a crew que está a colocar 2725 novamente no mapa estivesse destinada a voos maiores. Recentemente anunciaram uma ligação à Sony Music Portugal, os concertos vão de vento em popa e toda a estrutura que segura o quarteto continua a ser afinada, tendo Fumaxa sido uma das últimas “contratações” dos Instinto 26. Após dois anos de uma história que tem sido escrita com vários singles, arquitectados com base em instrumentais vindos de fora do seu circulo de criativos, o grupo está agora a trabalhar nos primeiros originais, com o EP de apresentação previsto para “atacar” o mercado em breve.
Vocês gerem a página do colectivo Instinto 26 no YouTube há cerca de dois anos mas eu nunca encontrei pegadas vossas a solo que tenham sido deixadas antes disso. Como é que começa a vossa ligação à música?
[Julinho KSD] Antes de haver os Instinto 26 já havia os Xpolituz, que era o Yuran, o Trista e uns quantos membros. Eu e o Kibow ainda não cantávamos. Eu não os conhecia ainda, só conhecia as músicas. Depois com o tempo fomos jogando à bola, ali no Montelavar, conheci-os e eles trouxeram-me aqui. Comecei a cantar com eles e tal. Fizemos um grupo e depois como o outro grupo já tinha acabado — também era muito difícil dizer “Xpolituz” — formámos os Instinto 26 nós os quatro. Depois entrou outro membro mas saiu, durou pouco tempo, e continuámos nós os quatro. E estamos aqui na via [risos].
Vocês os quatro dão a cara nos vídeos, mas existem mais pessoas a trabalhar nos bastidores com vocês, estou certo? Presumo que haja produtores, malta que vos ajuda a trabalhar os vídeos… Qual é a verdadeira dimensão da vossa equipa?
[Julinho KSD] Não te sei dizer ao certo quantos é que somos.
[Kibow] Somos bués.
[Julinho KSD] Somos para aí por volta de uns 15/16, todos membros dos Instinto 26, só que somos nós os cantores. No meio do grupo temos managers, road managers, produtores, beatmakers, temos tudo. Agora estamos a formar uma equipa e aver no que é que dá.
Nos vossos temas vocês identificam sempre o nome dos cantores envolvidos mas nunca taggam os produtores dos beats. As músicas são totalmente originais?
[Julinho KSD] Não. Agora é que vão começar a ser originais.
[Kibow] O que virá daqui para a frente é que sim.
[Julinho KSD] A equipa foi formada já há algum tempo mas só agora é que tivemos forma de o fazer.
E quem são esses produtores que integram a vossa equipa? É malta que também está a dar os primeiros passos, como vocês, ou há também alguém com mais experiência no meio?
[Julinho KSD] O nosso filmmaker é o Carvalho, que é quem faz os videoclipes, etc. Depois temos o Fumaxa, que é o nosso produtor de beats, mais o Migz. Dos produtores vamos utilizando o Migz para a gravação de voz e vamos mandando para o Janga para fazer a masterização. De resto estamos a continuar a formar a equipa, [entre] actuações, etc. E é isso.
De onde vem a escolha do nome Instinto 26?
[Trista] “Instinto” vem do nosso instinto. Achámos que era uma palavra engraçada. E “26” porque uma vez eu e o Julinho contámos as nossas rastas e por acaso temos 26 os dois. E ya, achámos engraçado. Ficou 26.
[Julinho KSD] Coincidência!
Acaba também por haver aí uma certa ligação ao futebol. “Instinto 26” é algo que facilmente pode caber nas costas de um equipamento.
[Trista] E vão ver.
[Julinho KSD] Já temos até.
Vocês quando surgiram em cena estiveram associados a duas labels: a Zoomúsica e a BdG Records. Isto foram projectos também criados por vocês ou eram estruturas que já existiam e que vos ajudaram a direccionar a vossa cena?
[Kibow] A Zoomúsica é o espaço onde nos encontramos agora. Foi um espaço que, juntamente com o Tristany, o irmão mais velho dele [do Trista], e os pais dele, que conceberam este espaço. Após eles construírem este espaço, eles os dois [Trista e Yuran] decidiram, por brincadeira, vir cá, começaram a vir cá, criaram os Xpolituz — o grupo que anteriormente tínhamos falado — e depois começámos a vir cá todos e isto já era o Zoomúsica. Já era uma palavra que nós utilizávamos. “Não sei quê, vamos ao Zoo”. [Identificávamos] Zoomúsica no YouTube quando gravávamos na Zoomúsica. Essa é a explicação de Zoomúsica. A BdG foi uma editora com a qual nós fizemos um contrato, assinámos com eles, estivémos um “x” tempo com eles, e pronto. Terminámos o contrato, cada um seguiu o seu caminho e está tudo bem.
Então este sítio onde estamos, a Zoomúsica, é onde vocês gravam e ensaiam?
[Julinho KSD] Gravávamos. Este aqui é o nosso estúdio anterior, onde nós gravávamos as coisas. Nós agora estamos noutro espaço, que é concebido pelo Joaquim, etc. Outros estúdios. Este foi onde nós começámos mesmo. Nós damos valor a isto aqui porque foi o nosso começo.
Sendo que são quatro membros e até abrangem vários registos diferentes, do drill ao afrotrap, também com músicas a solo à mistura, como é que funciona a vossa dinâmica dentro de estúdio? É um trabalho, de certa forma, mais individual e de maior liberdade ou pensam sempre como um todo?
[Julinho KSD] Depende. Nós à noite estamos juntos. Se surge um instrumental, amanhã o Trista já tem a letra, o Yuran já tem a letra… É assim. Chegamos no estúdio, estamos aqui todos parados outra vez, metem um instrumental, gostamos, fazemos todos aqui no estúdio. Independentemente do sítio, simplesmente só gostamos da música e fazemos.
E como é que lidam com a distinção de sonoridades? É uma coisa pensada ou é sempre algo que surge com naturalidade? Acima de tudo, como é que vocês próprios se identificam?
[Julinho KSD] Nós não nos identificamos com nenhum desses tipos. Simplesmente só vamos fazendo acontecer. Nós somos artistas e vamos-nos habituando e adaptando ao instrumental.
E o que é que vos inspirou durante todo este processo?
[Julinho KSD] A mim, as minhas origens. Tem ali um típico beat afro, afrotrap, dancehall… Vem de África, pronto. Eu adaptei-me a isso e gosto disso. Os rapazes eu sinto que eles são mais internacionais. Esse aqui [o Kibow] é maluco pelo trap inglês, drill, etc.
[Kibow] Ya. Londres é a cena.
Sim, eu a ti vejo-te mais ligado ao drill. O Trista também.
[Kibow] Até aos meus 15/16 anos eu só ouvia rap old school e Força Suprema. Rap old school americano e Força Suprema. Mais nada. Só ouvia isso. Depois comecei a crescer, comecei a ficar mais velho e a ouvir mais coisas. Abri o meu leque das coisas que eu ouvia. A minha influência é Força Suprema, rap old school e depois o que eu comecei a ouvir quando comecei a ser mais velho, que era aquele rap americano mais recente, mais new school. Depois o drill inglês, por aí. Eles vão dizer as [influências] deles mas o grupo funciona um bocado à base disso. Nós gostamos de tudo.
Metem tudo num caldeirão.
[Kibow] Ya. Juntamos tudo e fazemos acontecer alguma coisa.
Vocês tiveram recentemente um ponto de viragem com o “Sentimento Safari”. Como é que vocês analisam o que tinham antes e o que veio depois disso?
[Julinho KSD] Estávamos a sentir mais ou menos que ia acontecer isso. Tinha de acabar por acontecer. Nós já tínhamos trabalhado muito para isso. Portanto em algum momento tinha de chegar. Foi no “Sentimento Safari”, mas já tinha sentido que tinha vindo no “Foreign Car”. Era só um cheirinho para o people ouvir. Depois o people ficou com entusiasmo a ouvir quando saiu e foram ouvir. E agora vão continuar a ouvir.
Como se trata de um tema teu a solo, que tipo de feedback é que recebeste?
[Julinho KSD] Foi um grande feedback mesmo. Feedback muito positivo.
De norte a sul do país, imagino.
[Julinho KSD] De norte a sul. Nós agora estamos a viajar de norte a sul e acho que é mesmo pelos seis milhões [de visualizações] que estamos ali. Estamos a dar certo, pelo nosso trabalho, temos aqui a nossa equipa formada. Onde eu for, eles estão comigo. Onde eles forem, eu estou com eles.
Dado terem um catálogo ainda tão curto, como é que é chegarem ao momento do concerto em que tocam o “Sentimento Safari” e têm toda a gente da plateia a cantar a letra do início ao fim com vocês?
[Julinho KSD] É lindo [risos]. Ya. Não tem como. É uma cena nova, diferente, que eu nunca tinha visto. Só tinha visto através do público, a olhar tipo… Por exemplo, no ano passado eu estava no Sumol [Summer Fest], ali no público… No próximo ano estou lá eu no Sumol em cima do palco a brilhar.
E, lá está, dado ainda não terem muitas faixas, como é que funciona o vosso espectáculo ao vivo? Tocam só os temas que já sairam cá para fora ou têm sempre alguma coisa extra na vossa bagagem?
[Julinho KSD] Em termos de actuações nós já temos as músicas todas organizadas. São músicas que já saíram e as músicas que irão sair nós metemo-la ali por volta desses dias. Por exemplo, se uma música sair agora, dia 20, nós vamos cantá-la numa actuação dia 18, para dar aquela promoção. Para o people ficar “ya, a música vai sair. Essa música foi bonita”. Vamos ver.
Agora mais recentemente surgiu a vossa ligação à Sony. Eu sempre tive a ideia de que já existiam editoras grandes atrás de vocês, principalmente logo após o “Sentimento Safari”. Foi aí que começaram os primeiros contactos ou isto é realmente algo muito recente que aconteceu de um momento para o outro?
[Julinho KSD] A Sony sim. Mas nós já tínhamos propostas de outras editoras muito antes. Eram boas editoras mas nós negámos mesmo porque não nos chamaram a atenção.
E o que significa para vocês pertencer agora a um catálogo de artistas como aquele que a Sony tem?
[Julinho KSD] Significa muito. Só lá estão os grandes. Portanto estão já a considerar-nos grandes.
Presumo que estejam neste momento a cozinhar coisas novas. O que se segue em Instinto 26? Vem aí um EP, um álbum, ou planeiam continuar a trabalhar single a single?
[Yuran] Vem aí um EP, claramente. Estamos agora muito perto de lançar também um single do Julinho. Depois disso é investir em EPs também, para o people continuar a consumir. Sempre assim. Essa é a dica.
Então já estão a construir esse EP neste momento?
[Yuran] Não vamos dar assim muito quê, mas…
[Kibow] Já está a ganhar umas linhas, ya.
Tem título, já?
[Kibow] Não, não. O título é a última coisa que nós decidimos. Portanto…
Com que produtores é que estão a trabalhar para esse capítulo? Já me falaram no Fumaxa, no Migz…
[Kibow] Depois temos o Ivandro e o grupo dos amigos do Fumaxa.
O Ivandro aparece em vários dos vossos temas. É também um membro de Instinto 26?
[Kibow] Não. É nosso amigo. É dos nossos amigos mais próximos.
[Julinho KSD] Tinha uma ligação connosco antes de haver os Instinto 26 e sempre continuou. Ele já era músico. Estamos todos na mesma área, portanto porque não trabalharmos juntos?